Não. Não creio...
Como sabes, estou prestes a dar um passo importantíssimo na minha vida. Ao contrário das minhas amigas pós-modernas, desde criança que tive o desejo de casar “de branco”, entrar na igreja “de véu e grinalda”, e dizer o “sim” diante do altar. Felizmente encontrei alguém que, como eu, foi educado segundo a tradição católica e que também tem a mesma vontade de sacramentar o acto do casamento.
Se me conheces bem, sabes que tento ser perfeccionista e organizada (às vezes até demais), e, de certa forma, tento levar as coisas à séria, “comme il faut”. Por isso, para mim não faz sentido fazer uma festa muito bonita, encher a igreja de flores, meter lá toda a gente a ouvir um padre, recitar a lengalenga típica da ocasião e simplesmente não passar disto. Já que cá estamos, façamos as coisas com consciência e responsabilidade.
Desta forma, nos últimos meses, tenho-me re-aproximado da Igreja, de forma a interiorizar o espírito do acontecimento que se avizinha. Acontece que estes quase dez anos de afastamento dos ritos católicos deram-me espaço para pensar por mim e criar as minhas próprias teorias e crenças, que em alguns (vários) pontos, choca com a teoria que durante muitos anos me foi ensinada.
Estes pensamentos foram despertados quando, ao assistir à celebração de um baptismo, o padre pergunta aos pais da criança: “Credes no Espírito Santo, na Santa Igreja Católica, na comunhão dos santos, na remissão dos pecados, na ressurreição da carne e na vida eterna?” A resposta-programada era: “sim, creio”. Mas para mim a resposta é outra: Não. Não creio.
Não creio no Espírito Santo, como ele é entendido na Igreja Católica. Acredito numa força maior que comanda o Universo, não no Deus de Amor e Paz que me apresentaram em pequena.
Não creio na “Santa” Igreja Católica, que condena que se atire arroz aos noivos quando saem da igreja porque há tanta gente a morrer de fome, mas que é apenas a instituição mais rica do mundo, e onde só agora se prevê que os padres comecem a pagar impostos. Que toma medidas arcaicas e condena os simples mortais por estarem demasiado tempo na Internet ou a ver televisão, em vez de lerem a Bíblia. Que condena o uso do preservativo, mesmo em comunidades onde o risco de infecção com o HIV é de cerca de 80%...
Também não posso crer na comunhão dos santos, porque a beatificação e a canonização são matérias sobre as quais não tenho conhecimentos suficientes para poder formar uma opinião esclarecida.
Não creio na remissão dos pecados. Um pecado é um pecado, um bom acto é um bom acto. E o último não apaga o primeiro. Nem através do arrependimento, nem da confissão. Os nossos pecados são coisas com as quais temos que viver, se possível evitando-os (mas aqui entra a discussão sobre o conceito de pecado – os 7 pecados capitais? A infracção aos 10 mandamentos?...).
Mas sobretudo, não creio nem na ressurreição da carne, nem na vida eterna. Eu sou este corpo, este ser que apenas existe enquanto vive. O que fica depois da morte é a lembrança. A matéria desaparece. A carne e os ossos são destruídos, e… pufff! Era uma vez. Eu vivo esta vida, achando que é a única, em vez de vivê-la na esperança de outra melhor.
Podes achar ridículo depois de tudo isto eu continuar a querer passar por todo o processo católico de celebração do casamento. Mas de uma coisa estou ciente: Tudo o que eu disser diante do altar será verdadeiro e sentido. Mesmo com todas as diferenças de fundo entre as minhas convicções e as bandeiras da Igreja Católica, numa coisa estamos de acordo: devemos praticar o bem. Seja para obter a “salvação eterna” ou simplesmente para deitarmos a cabeça na almofada e dormirmos descansados.